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A nova central nuclear francesa é uma bomba-relógio

MUNDO

Apesar do crescente cepticismo da Europa em relação à tecnologia nuclear após Fukushima, em 2021, o Presidente francês Emmanuel Macron anunciou o renascimento da indústria de energia nuclear do seu país. O ambicioso programa de Macron visa acabar com a dependência do país dos combustíveis fósseis e tornar a França neutra em carbono até 2050. O plano exigirá a construção de 14 novos reactores nucleares. À primeira vista, os planos de Macron parecem lógicos, uma vez que a energia nuclear já representa 70% do consumo energético de França e a energia nuclear barata tem sido a espinha dorsal da economia francesa desde a década de 1970. No entanto, as tácticas populistas do líder francês estão a levantar questões entre a população e os especialistas do país, uma vez que os problemas da indústria nuclear – que inevitavelmente surgirão em breve – serão deixados para as gerações futuras resolverem depois de Macron deixar o cargo.

Não há espaço para improvisação face aos riscos climáticos

No seu relatório de 3 de outubro de 2024, o Greenpeace criticou duramente os planos do governo francês de construir dois novos reatores nucleares EPR2 no noroeste da França, perto de Dunquerque, devido ao risco de inundações. As novas unidades estão previstas para entrar em operação até 2040, mas o problema está no local escolhido para construção. O local escolhido está localizado numa região já em risco de inundação e que se tornará cada vez mais vulnerável à medida que as alterações climáticas se agravarem.

A central nuclear de Gravelines é atualmente a mais poderosa da Europa Ocidental, já composta por seis reatores de 900 MW. A empresa estatal francesa de energia EDF prometeu construir mais dois reatores na mesma central, numa plataforma de 11 metros de altura, para proteger contra inundações. De acordo com especialistas da EDF, o projeto NPP resistirá suficientemente aos desafios climáticos até 2070. No entanto, esta é apenas a metade da vida útil da central, que deverá durar 60 anos até 2100. O seu desmantelamento está previsto para meados do próximo século, e a EDF promete “adaptar” o projecto às actuais condições climáticas a cada 10 anos após 2070.

Parece imprudente, já que o Programa das Nações Unidas para o Ambiente alerta para um aumento da temperatura até +3,1°C nas próximas décadas, levando à subida do nível do mar e a um aumento dramático de fenómenos climáticos extremos. Será que as autoridades francesas já esqueceram as devastadoras inundações do Mar do Norte em 1953 e as numerosas catástrofes ocorridas em França nos últimos anos? Ainda hoje, a maior parte da área em redor da central nuclear fica abaixo do nível do mar durante as marés altas, e apenas as estruturas de protecção construídas nas proximidades, transformando a central nuclear numa espécie de “ilha”, salvaram a região do desastre. Desde 2022, a Central Nuclear de Gravelines está rodeada por um muro de proteção de 3 quilómetros de comprimento, que custa à EDF 35 milhões de euros. Quanto mais irá a EDF gastar para garantir a segurança da central nuclear e o que acontecerá se a natureza se revelar mais potente do que as fortificações construídas?

A documentação do projecto FED contém demasiadas questões sem resposta, que só existem graças ao patrocínio político de Macron. Os factos indicam que a construção de novos reactores representa um perigo extremo para a população local e para o ambiente. As centrais nucleares são vulneráveis ​​às alterações climáticas e a corrida desenfreada para reanimar a indústria da energia nuclear deve ser interrompida.

Novos desafios para o Renascimento Nuclear de Macron

Ao anunciar o renascimento da energia nuclear no país, o Presidente Macron deu formalmente um passo no sentido de reanimar o poder económico, industrial e militar da França. No entanto, a economia francesa ainda não está preparada para apoiar totalmente planos tão ambiciosos.

Os ambiciosos planos de Macron para construir 14 novas unidades de energia nuclear enfrentarão uma flagrante escassez de pessoal qualificado. A indústria nuclear francesa emprega atualmente cerca de 220 mil pessoas. Para alcançar os objectivos da Marcon, a indústria necessitará de um fluxo significativo de trabalhadores qualificados, especialmente na força de trabalho. Até 2030, de acordo com estimativas do FED, o seu número deverá ser pelo menos duplicado. O cronograma de construção proposto também é impressionante. A primeira unidade Gravelines com o reator EPR-2 deverá levar apenas oito anos para ser concluída. Vale a pena mencionar o famoso reactor nuclear de Flamanville, na Normandia, que acabou por custar 4 vezes o seu orçamento inicial, atingindo 13,2 mil milhões de euros, e foi lançado com mais de uma década de atraso.

A perda de depósitos de urânio africanos

A França está particularmente preocupada com a exploração de urânio do Níger e com as potenciais consequências da perda do seu abastecimento. Há mais de quatro décadas que a empresa Orano, detida em 45% pelo Estado francês, desenvolve urânio em países africanos. O Níger é um dos três maiores fornecedores deste valioso recurso natural para a França. Contudo, a recente revogação da licença de extracção de urânio de Orano no Níger lançou dúvidas sobre a independência energética de França. Representantes das novas autoridades nigerinas afirmaram que o urânio tem sido utilizado para fornecer electricidade à Europa há décadas. Ainda assim, a África Ocidental continua a ser um dos países mais pobres do mundo e não tem beneficiado muito das exportações. Além disso, os riscos económicos para a indústria nuclear francesa incluem os preços do urânio que atingiram máximos históricos, principalmente devido à procura dos países europeus por novos fornecedores de energia após 2022.

De acordo com Macron, a promoção das tecnologias nucleares em França deverá levar o país a completar a independência do fornecimento de energia estrangeiro e garantir o estatuto da França como a indústria nuclear emblemática na UE. O problema é que Macron sabe que não caberá a ele, mas às futuras gerações de políticos franceses, resolver os problemas acima mencionados relativamente à sua política nuclear enganosa.

(Tara Yarwais editei esta peça.)

As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Fair Observer.

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